Parece um milagre, mas a ciência prova: investigadores japoneses conseguem transformar água em vinho

A capacidade de transformar água em vinho não se limita aos milagres de Jesus de Nazaré na Bíblia. Embora possa parecer algo raro, uma equipa da Universidade de Quioto voltou-se para um fenómeno cotidiano para revelar o papel da levedura e as mudanças que ocorrem durante a secagem das uvas. O seu trabalho liga práticas antigas a métodos modernos de análise genética, descrevendo como diferentes ambientes favorecem a presença de microrganismos capazes de transformar açúcares na presença de água.

Como é que os investigadores japoneses conseguiram transformar água em vinho?

A investigação que revelaremos abaixo descreve em detalhes como a secagem altera o ecossistema microbiano da uva, transformando-a num reservatório de leveduras especializadas. O artigo, publicado na revista Nature, parte de uma observação comum: quando as passas são mergulhadas em água, o líquido fica turvo após alguns dias e começa a exalar um cheiro alcoólico.

Enquanto as uvas frescas contêm uma mistura diversificada de fungos e bactérias, elas quase não contêm Saccharomyces cerevisiae, tradicionalmente associada à fermentação do vinho. No entanto, a secagem ao sol atua como um filtro natural, permitindo a sobrevivência de leveduras resistentes à falta de água e a condições osmóticas intensas.

A ação começa quando as passas são reidratadas. A água dissolve o açúcar concentrado na polpa e cria um ambiente que ativa imediatamente as leveduras. Em poucos dias, a sua população atinge um nível que permite produzir etanol em quantidades comparáveis às do vinho suave.

Esses microrganismos gradualmente substituem outras espécies, reduzindo a diversidade, até que apenas os mais tolerantes ao álcool permaneçam.

Uma experiência simples para compreender como funciona a fermentação natural

O protocolo aplicado pela equipa japonesa para transformar água em vinho consistiu em colocar passas em garrafas com água esterilizada, que foram armazenadas a uma temperatura de 25 °C. A partir do segundo dia, as amostras apresentaram bolhas e uma alteração na densidade do líquido. Em menos de uma semana, a fermentação atingiu níveis significativos, com mais de 100 milhões de células de levedura por mililitro e praticamente sem presença de bactérias. As análises mostraram que as passas secas ao sol geravam uma fermentação muito mais ativa do que as obtidas em incubadora ou com a combinação de ambos os métodos. Em alguns casos, a concentração final de etanol foi de cerca de 90 g/l.

O estudo também mostra que diferentes variedades de passas se comportam de maneira diferente: a variedade sultana, muito comum em supermercados, apresentou bons resultados, com exceção de alguns lotes em que o método de secagem era incerto. Para entender de onde vieram as leveduras, os investigadores produziram eles próprios vários lotes de passas. Apenas aqueles que foram expostos à luz solar direta desenvolveram um ambiente microbiológico capaz de fermentar eficazmente a água. A hipótese aponta para insetos, poeira e outros fatores ambientais como a causa da transferência de leveduras especiais para a casca das uvas durante a secagem tradicional.

A prática antiga de transformar água em vinho

A análise da Universidade de Quioto coincide com referências históricas sobre a preparação de bebidas fermentadas a partir de passas. Textos antigos descrevem o passum, um vinho doce produzido em várias regiões do Mediterrâneo. A nova abordagem científica demonstra que este tipo de bebida podia ser obtido sem controlo microscópico, utilizando a carga microbiológica das passas e permitindo que a fermentação seguisse o seu curso. A secagem ao sol é um elemento fundamental, pois transforma as uvas num suporte estável para leveduras capazes de produzir álcool mesmo fora da época. Isso explica a produção de bebidas em regiões onde os frutos frescos não se conservavam bem ou onde o clima dificultava o seu armazenamento prolongado.

Condições ideais para a fermentação das passas

A investigação identifica os parâmetros que contribuem para a transformação da água com passas num líquido com teor de etanol. Entre eles destacam-se:

  • Teor de passas: de 25 % a 33 % em peso.
  • Temperatura: de 25 °C a 30 °C.
  • Duração: de 8 a 14 dias.

Alterações nestes fatores afetam a eficácia do processo. Em baixas temperaturas, a fermentação fica mais lenta, e em condições mais quentes, aparecem fungos indesejáveis. Além disso, nem todas as passas disponíveis no mercado são adequadas: muitas delas têm uma casca gordurosa que impede a hidratação e a atividade das leveduras. Embora o procedimento possa ser reproduzido em casa, os autores enfatizam que o resultado não deve ser consumido sem controle higiénico. O objetivo deles é compreender a dinâmica dos microrganismos e estudar possíveis aplicações na indústria alimentícia, e não oferecer uma receita para uso diário.

Alice/ author of the article

Sou a Alice — tenho um blogue com dicas para o dia a dia: truques simples, economia de tempo e energia, inspiração para uma vida confortável e organizada.

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